"Que as palavras que eu falo não sejam ouvidas como prece e nem repetidas com fervor: apenas respeitadas, como a única coisa que resta a um[a mulher inundada] de sentimentos." (OM)

domingo, 27 de junho de 2010

Que tal?


Censuraram as verdades que eu digo. Mas há coisas que é preciso dizer.
Eu não tenho medo das palavras.
Não seja como a Lua que insiste em esconder periodicamente parte da face de seus sentimentos e angústias, que não diz o que pensa ou o que sente. Não seja hipócrita, porque esta face está lá o tempo todo.
As palavras, feias e sujas, estão lá, caladas. Covardemente
Existem coisas que precisam sair de dentro de você. Vamos lá, vomite todas elas. O vômito é amargo, não? É sujo, porco, feio. E tudo aquilo estava dentro de você. Fede. Fede e ninguém suporta, mas entende como é necessário?
Se não quiser mexer com estes pedaços regurgitados, palavras vindas e feitas de você, ao menos grite! Experimenta! Grita com a garganta, arranhando tudo por dentro. Usa o ar de seus pulmões e consome o do mundo a sua volta também.
Grita, porque o grito é a palavra em seu estado puro.

quarta-feira, 23 de junho de 2010

Teu caderno


“Eu só peço a você um favor, se puder, não me esqueça num canto qualquer.”
(Vinícius de Moraes)


Eu sou o teu caderno.
Um caderno de folhas alvíssimas em que preencheste com tua história.
Em mim, gravado em tinta preta, que não apaga, e em caligrafia torta, estão os teus segredos, às vezes borrados em gotas para que ninguém tome conhecimento; estão as tuas promessas, estas em letras garrafais; estão todos os teus planos pro futuro, vindos de um passado feliz e distante em experiências.
Um dia, pois, esquecestes teu caderno por aí.
Outros usaram. Tentaram escrever nele, mas só havia lápis. Jogado na rua, pisado em cima. Teu caderno sempre protegido em teus braços foi parar no meio do frio e da chuva, e teve que aprender na marra a agüentar as intempéries e tempestades.
Uns tentaram pegar o caderno e cuidar do caderno, entretanto, há nele o teu nome gravado e, sendo assim, te pertence e era novamente deixado de lado.
Há que se ocorrer um reencontro de papel para luz dos olhos do escritor, e há que se decidir o destino do teu caderno.
Ou continuas a escrever tua história com final feliz (ou outro final qualquer), ou arranca todas as folhas escritas por ti junto de teu nome. Caso contrário, este será apenas mais um caderno sujo, úmido e borrado, que só conhece histórias tristes.

Vinte e dois do seis de dois mil e dez, a R.C.

sexta-feira, 4 de junho de 2010

Direções.


Eu olhava pela janela quando algo curioso aconteceu. Um casal, um pequeno casal com brilho no olhar se despedia em frente ao trem. Um abraço apertado daqueles que tentam segurar o momento com as mãos, e os braços se afastando levemente durante eternos segundos, quando na iminência de se largarem, visto que ela não agiria por determinação, ele a puxou. Abraçaram-se. Beijou-a, de início um não, um quase sim, uma correspondência e finalmente um não. Era não, mas era um não ir embora também. Para ela, largar o passado era difícil, se desfazer das velhas histórias, dos velhos objetos, dos velhos sentimentos... Uma questão de sofrimento. Sentaram-se. Ele tentou, ela deixou. Deixou que beijasse seus lábios, seus olhos, sua face toda como nunca antes alguém beijara, nem mesmo ele. Deixou e não entendeu o porquê de tudo aquilo, já que antes era ela que o tinha feito sem um olhar sincero de retorno. Dois jovens cheios de defeitos. E daí? Acontece que o tempo passa, e este não perdoa. Vamos? Vou então. Não. Vou. Foi. Sem olhar pra trás foi. Aquele trem porém demorou mais que os outros. Destino? Talvez. Ela sempre acreditou em destino. Era tempo suficiente pra ela sair daquele vagão e dizer o sim, e fazer o sim - cinematográfico - com direito a aplausos dos presentes e rodopio sentimental. Mas de que adiantava se ele nunca acreditou em destino? O trem demorou ainda ali, tentando fazer com que um dos orgulhosos abrisse mão de alguma coisa que era pra acontecer, o trem tentou mais que os dois, e sem sucesso fez o barulho cotidiano e fechou as portas lentamente. Acabou. A minha história seria diferente se eu fosse aquela menina, mas aquela já não era mais a minha história, já não era mais o meu presente.

Foto: filme Slumdog Millionaire